A liberdade que o dinheiro não compra

 




Fui livre ontem, quando tive vontade de dizer um monte de absurdos à minha mãe por não concordar com muita coisa que vejo no estilo de vida dela, mas me segurei, porque sei que seria uma energia gasta em vão, sem propósito nenhum a não ser o de ofender.

Mais tarde, me senti livre quando não cedi ao desejo de me apegar aos pensamentos negativos só porque o futuro que eu tanto imaginei não está saindo bem como eu esperava, e por causa disso, meu desejo era o de desacreditar que algo bom pode estar me esperando bem ali, na próxima esquina.

Ainda, no mesmo dia, me senti livre quando em conversa com uma amiga, que eu não via há tempos, não senti necessidade de falar da vida de ninguém, a não ser da nossa, e mais livre ainda, quando fizemos piada do fato de estarmos na casa dos trinta e não sermos bem sucedidos de acordo com os padrões da sociedade.

Só ontem, me senti livre três vezes. Talvez minha ideia de liberdade esteja sendo ampliada, ou melhor, talvez, agora ela esteja sendo melhor compreendida.

Também me senti livre quando, esta semana, gravei o último episódio da primeira temporada do meu podcast. Não porque era algo que pesava; ao contrário, eu amo fazer. Mas porque, para fazer, eu precisei renunciar alguns vícios, inclusive a preguiça, e criar determinação, manter o foco. Para isso, tive de aprender a controlar a mim mesmo o tempo todo, inclusive os pensamentos que me geraram o desejo de desistir.

Me sinto livre quando sento todos os dias na frente do computador e escrevo uma crônica. Quando faço isso, me sinto livre da inação e da preguiça. Me sinto livre mesmo quando desanimado e cansado, ainda encontro fé dentro de mim para continuar acreditando em algo que só eu vejo futuro, algo que eu acredito sozinho.

Me sinto livre quando controlo o desejo de ser agressivo e raivoso com as pessoas. Quando seguro a língua nos momentos em que não tenho nada a acrescentar, só criticar e diminuir.

Também penso que eu me sentirei muito livre quando eu tiver o principal recurso que nos concede alforria em um mundo capitalista: o dinheiro. Com ele eu poderia mais, poderia manifestar minha essência no mundo com mais força. Ter mais autonomia e poder de manifestação na matéria.

Mas é bom lembrar que ele, o dinheiro, não é a liberdade em si. E também não acredito que ele consiga comprá-la, ele só a dá para quem já a tem. Conheço uma pessoa, bem próxima a mim, com muito dinheiro, mas que é tão aprisionada, que chega a me dar dó.

Primeiro, aprisionada pelo medo de perder a grana que tem. Depois pelas crenças que manipulam a vida dela, a enchendo de temor, vivendo em uma paranóia sensacionalista de um mundo terrível.

Você também deve conhecer alguém assim, ou várias pessoas assim. Gente que poderia se exercer de forma mais livre e plena, mas não o faz, mesmo com dinheiro, porque as correntes que as prendem são outras. São invisíveis e estão trancadas por dentro.

A primeira vez que tive contato com esse tipo de reflexão foi há alguns anos, quando uma psicóloga me abriu os olhos para que a solução dos meus problemas, e de muitas pessoas que ainda viviam com a família e se sentiam presas e incapacitadas pelo estilo de vida delas, não era apenas o dinheiro.

Foi quando ela citou o exemplo de um conhecido dela, também gay. Ele tinha dinheiro suficiente para viver a vida que quisesse, já morava fora da casa dos pais, mas ainda não se sentia livre do jugo castrador da família.

Naquele dia, percebi que a liberdade não morava no dinheiro ou em estar distante da pessoa ou das pessoas que você julga te prenderem. Me parece que as correntes, além de invisíveis, também não respeitam localização geográfica; atravessam fronteiras e continentes, porque o jugo é mental.

Escutar o exemplo da minha psicóloga, me fez perceber que eu não estava tão mal quanto eu pensava. Muitas das minhas correntes já haviam sido quebradas. Mais alguns anos e eu iria notar que elas mal estavam presas direito; estavam todas frouxas e largas. Bastava que eu as removesse com as minhas próprias mãos para que eu estivesse livre.

Se o tipo de liberdade que eu desejo ainda não chegou, é porque não é o tempo. Algo ainda falta para que isso aconteça. Por enquanto, vou me desfazendo das correntes que ainda me restam, uma a uma. Retirando os hábitos, vícios, comportamentos, crenças e tudo aquilo que nem fazem parte de mim. Para que, quando o momento de soltar a última delas chegar, eu possa estar acompanhado da minha mais pura essência. E assim, poder voar sem nunca mais olhar para trás.

Comentários