Parece tristeza

 




Cabisbaixo, olhando para o nada. As pessoas falam comigo e eu respondo com murmúrios monossilábicos. Parece tristeza, mas não é não. Meu corpo está tão cansado quanto minha alma, do ruído que minha mente faz sem parar. E aí eu carrego o celular comigo para onde quer que eu vá, só para não ter que ouvir o som das vozes na minha cabeça.

Em dias de noites mal dormidas o incômodo é maior e a falta de sensibilidade do mundo parece invadir meus limites. E os gurus de internet me dizem para não levar o celular comigo para o banheiro, para comprar o curso que vai fazer com que minha procrastinação suma, o treino ideal para o corpo ideal que vai me fazer mais forte, jovem, gostoso e inseguro pra caramba (mas isso eles esquecem de dizer).

E eu não aguento mais abrir as redes sociais de tanta gente me dizendo o que fazer e como eu deveria ser para atingir o ponto alto, o orgasmo social. Mas eu prefiro gozar sozinho. E minhas reclamações caem no meu colo, porque o chato é você, você que não quer se adequar e andar conforme manda todo mundo, porque hoje em dia todo mundo manda, todo mundo sabe, todo mundo é alguma coisa. E quem não é nada, como é que fica? Acho que tem que dar um jeito de também fingir ser alguma coisa.

Você só quer sentar em silêncio com a porta do quarto fechada e ficar encarando o nada por um tempo, até que uma música no repeat te faça querer expressar alguma coisa enquanto você a escuta. Mas não é tristeza não. Só parece ser.

E a mente que não se cala me faz pensar em quem vai ler isso aqui e no que essa pessoa vai pensar. Mas eu afasto o pensamento porque se penso nisso, logo deixo de escrever e desisto de tudo, assim como tenho feito com muita coisa na minha vida. E desistir agora, não parece uma opção.

E é quando escrevo esse tipo de coisa que aparece do nada uma tia qualquer e vem me dar conselhos sobre como a vida é boa, e que eu não preciso passar por nada sozinho; só falta vir me dizer que Jesus me ama. Mas não é tristeza, não, tias. Não é tristeza não.

Sou eu tentando entender porque desisti de tanta coisa. Sou eu inconformado enquanto falo para mim mesmo que aceito de bom grado tudo o que tenho, e de fato eu aceito, acho que esse é o problema. Talvez eu devesse bater no peito e dizer: comigo não, vida! Aqui quem manda sou eu e eu quero meu milhão antes dos quarenta (já que eu perdi a cota para o “antes dos trinta”).

Sou eu tentando expressar o que há tempos eu não sabia como. Sou eu esperando a casa ficar vazia para poder me sentir em casa. Sou eu no repeat enquanto escuto música. Mas nem é tristeza.

São o bando de bundas e corpos de machos musculosos no instagram me mostrando o que não sou, são os gurus, as conversas sem futuro, as pessoas querendo viralizar por qualquer coisa, a decadência política e a ignorância do povo, os representantes da espiritualidade e as normas para que a gente se aprisione cada vez mais.

É a minha intolerância para o raso, que só aumentou dos meus quinze anos para cá. Sou eu organizando minha agenda do mês porque já cansei do rumo que a minha vida tá levando (nenhum, no caso). E eu preciso fingir acreditar que eu consigo controlar alguma coisa. E talvez eu até consiga, a hora em que acordo, por exemplo. De resto, é surpresa atrás de surpresa. Tem dias, como hoje, em que pareço perder a fé quase por completo. Mas não é tristeza, não. É consciência, e a minha felicidade que é desanimada.

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