O quarto do desconforto
O ventilador gira do meu lado. Lá fora a chuva cai, mas aqui dentro do quarto está um calor horrível. A janela permanece fechada porque se eu abrir molha o chão inteiro. Não encontro uma posição confortável na cama. O lençol de elástico está saindo dos cantos do colchão, minha perna está ficando cansada de estar apoiando a outra, cruzada sobre ela. Tem dias em que nada funciona, nada te acolhe.
Dias em que as coisas caem da tua mão, você está desatento e não vê a hora de poder voltar a dormir. Em dias assim a minha visão fica turva. Tudo me irrita, me tira do lugar, me incomoda. Qualquer coisa é motivo para brigar, qualquer coisa mesmo. Opiniões divergentes sobre filmes, música, biscoito ou bolacha. Qualquer dessas merdas que não importam nada, são motivo para se querer ofender alguém.
Está tudo igual, todos os móveis do meu quarto estão no lugar de sempre, o ventilador funciona como em todos os dias, o notebook está em ordem cumprindo sua missão, o lençol de elástico sempre saiu dos cantos do colchão como em todas as vezes em que eu me sento na cama. O problema sou eu, eu que estou desconfortável comigo.
Eu que não estou cumprindo minha missão de me exercer independente das circunstâncias, eu que estou subindo e descendo, dando gritos em uma montanha russa dentro de mim. Mesmo que por fora minha cara seja de apatia.
Você já teve medo de enlouquecer? Eu já. E de vez em quando me pego assim, com medo de ficar preso nas ilusões que eu criei e nunca mais conseguir sair delas.
E nessas ilusões a culpa é do ventilador que não funciona direito, da posição errada da minha janela que deixa a chuva cair dentro do quarto, do meu lençol que tem o elástico fraco e fica soltando do colchão. A culpa é do mundo que não quer que eu fique bem, a culpa é de qualquer um que ousar dizer que a culpa é minha.
Nessas horas eu esqueço que não é sobre culpa, e sim sobre responsabilidade. A saída é reconhecer a própria mediocridade egóica e infantil, e entender que você pode estar a um passo de ficar louco dentro de um quarto, só porque se nega a aceitar tudo aquilo que insiste em fingir que não existe.
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