O que me mata é a dúvida
Ir à praia no domingo ou aproveitar o dia de folga e dormir o máximo que eu puder? Experimentar aquele novo sabor de sorvete ou escolher o de sempre, que eu já sei que vou gostar? Perder 40 minutos do meu dia assistindo aquela série nova, que tá todo mundo falando sobre, ou assistir novamente mais um episódio da minha série favorita dos anos noventa?
De vez em quando eu me pego em dúvida sobre coisas muito simples, e essas dúvidas me consomem de um jeito que chega a me irritar. Eu quero as certezas. E aí é que mora o problema, porque não dá para ter certeza o tempo todo.
Nada me garante que hoje a praia vai ser legal, mesmo com o sol brilhando lá fora; ninguém garante que vou me conectar com a série do momento só porque todo mundo tá dizendo que ela é boa, ou que vou gostar do novo sabor de sorvete só porque ele é novo. Ninguém me garante nada.
E eu não quero só as garantias, eu quero tudo. Quero a diversão da praia, mas também quero o descanso e a paz de dormir o dia todo, quero a surpresa ao assistir uma história nova na TV, mas também quero a nostalgia e o aconchego de ver algo que eu conheci ainda na adolescência. Eu quero o ego infantil que diz que eu posso ter tudo.
Não quero pagar o preço da escolha para depois descobrir que o que eu escolhi nem era tão bom como eu imaginava. E o que é que eu tanto imaginava? Que expectativa impossível de ser alcançada é essa?
A sensação é a de que estou sempre perdendo algo melhor, inédito e incrível, que está acontecendo lá fora, nunca aqui. É como se eu não conseguisse ficar em paz com minhas escolhas.
A dúvida é sempre entre deixar o conhecido e o confortável e experimentar o que pode dar certo, o que pode ser bom. E o pode não significa que vai ser bom. O pode é possibilidade, e para dar certo depende de um monte de coisa, que não depende de mim.
E tudo o que não depende de mim, me tira do controle, e o controle é a mais gostosa ilusão que o ser humano pode ter. A falta de controle inclui o risco, e o risco me expõe, me desestabiliza e tira meu equilíbrio. Só que eu esqueço que para manter o equilíbrio é preciso balançar para os dois lados antes de se alcançar a estabilidade.
A dúvida fica me maltratando aos pouquinhos, me perturbando, e aí eu não vou à praia, mas também não consigo dormir porque fico pensando que estou perdendo a praia. Assisto a série nova, com a sensação de que eu iria me sentir melhor vendo a de sempre. A dúvida me deixa em lugar nenhum.
Nessas horas, me lembro de que não existe escolha certa. O que existe é o que faz sentido naquele momento para mim.
Não tem como evitar a dúvida, mas tem como se livrar do peso das escolhas mal feitas aprendendo a escolher melhor. E para escolher melhor é preciso se conhecer, e um bom jeito de conhecer alguém é através de perguntas. Pelo menos é o que eu faço nesses momentos.
Eu vou me questionando para tentar encontrar a saída desse terreno inseguro que é o da dúvida. Geralmente, percebo que o que falta é deixar de lado a ideia infantil de achar que o melhor está sempre lá fora; aceitar a responsabilidade pelas consequências das escolhas que faço, sejam elas quais forem, isso inclui não ficar reclamando porque gastei dez reais em um sabor de sorvete que eu detestei. Os sabores ruins de sorvete servem para mostrar quais são os meus preferidos.
Escolhas assertivas exigem responsabilidade e maturidade para aceitar de bom grado a ideia de que, sim, você sempre estará perdendo alguma coisa ao tomar uma decisão. E acima de tudo, a certeza de que não importa a escolha que eu faça na vida, elas sempre estão me ensinando algo.
É que o difícil sou eu me encarar como um aprendiz, porque quero sempre tá arrasando, sabendo tudo, sempre certo, e sem dúvida. Uma pena, porque toda dúvida antecede um aprendizado.
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