Um exercício de autoestima
Existem tarefas que exigem uma certa dose de autoestima da gente. Escrever, para mim, certamente é uma delas. Estou constantemente questionando a importância do que faço diante dos problemas do mundo.
Outro dia, dediquei um tempo da minha tarde para dar uma lida em algumas newsletters com um grande número de assinantes. Vi várias delas. E se encontrei algo em comum entre a maioria, era a importância do conteúdo que elas transmitiam.
Notícias sobre finanças, atualidades, tecnologia, mundo corporativo, marketing. Os temas eram variados. E como a autoestima mal trabalhada é algo delicado, facílima de se machucar, logo achei todas mais urgentes e necessárias do que a minha.
Eu não ensino nada a ninguém, não dou dicas, nem te atualizo sobre o mercado financeiro. Eu só compartilho minhas percepções da vida, meus medos e o meu amor por criação e arte. A quem interessa isso? Porque alguém iria querer me ler? Eu que não trago as últimas da política nem do esporte, eu que não dou a minha opinião sobre filmes ou música pop, eu que ainda tenho um blog!
Tem pessoas se pendurando em trens na fronteira do México com os Estados Unidos, tentando fugir da situação precária dos seus países, gente passando fome na minha cidade, no meu bairro, na rua onde eu moro.
Uma mulher outro dia me pediu para comprar um pacote de fubá para ela na entrada do supermercado, um pacote de fubá! E eu aqui, focado em sentar todos os dias na frente do computador para escrever essas coisas que não passam por lugar nenhum do concreto.
Essas coisas com as quais me perco e fico remoendo dentro de mim. Me parece que o mundo está cheio de coisas mais urgentes, e ele realmente está. Me pergunto se as influencers vendedoras de batons em lives também ficam se perguntando isso. Me pergunto para onde eu estou indo nesse mundo e para onde esse mundo está indo.
Por isso, escrever e divulgar o que eu escrevo é mais do que apenas um modo de melhorar minha escrita, ou de me preparar profissionalmente, mas sim, um exercício de autoestima. Um protesto contra o pensamento tirano e antiquado dentro de mim, que tenta me diminuir só porque assim ele não precisa lidar com o medo que a liberdade traz.
E talvez, para você, o seu exercício de autoestima seja enfrentar uma sala cheia de gente para apresentar um trabalho, ou talvez, quem sabe, pedir um aumento ao chefe. Dizer não, conseguir dez clientes novos, mostrar a alguém que o seu ponto de vista importa, mudar de profissão, ir visitar a casa dos sogros, terminar o relacionamento, começar o próprio negócio. Qualquer coisa que te desafie a pular além das cercas as quais suas crenças te fizeram ficar limitado.
Ou ainda, assim como eu, talvez você questione a importância do que faz, diante da densidade e urgência dos terrores que existem no mundo. Mas uma existência não anula a outra, cada peça dessa engrenagem tem sua importância para o bom funcionamento do todo. E o que você faz tem importância sim, seja na vida da sua família, na sua rua, no seu bairro, na comunidade onde você faz parte, ou até mesmo na minha vida, através de um comentário que você deixa na newsletter.
O mundo tá sempre fazendo a gente questionar o nosso valor, e me parece que no cálculo do sistema esse resultado é sempre pra menos do que pra mais. É fácil ter uma mente atrofiada e limitada em um mundo que faz questão de te vender insatisfação com quem você é, o tempo todo.
E eu sou bem injusto comigo quando desconsidero as configurações e complexidades do mundo em que a gente vive, as características e história de vida de cada indivíduo dentro dele e resumo tudo às minhas paranóias, tentando colocar nas minhas costas mais peso do que eu sou capaz de suportar.
Nessa de me comparar e me colocar pra baixo, acabo esquecendo das multiplicidades e singularidades de pessoas que existem no mundo, esqueço que nem só de newsletters sobre notícias e atualidades é feita a web. Também existem milhares de outros criativos escrevendo sobre suas vivências e percepções da vida. Que também existem newsletters de humor e conteúdo leve. Que existe de tudo nesse mundo e sempre tem alguém apto a ouvir, ler, ver, o que você tem para mostrar. E é responsabilidade sua, mostrar que o seu ponto de vista importa.
Eu não sou culpado pelos problemas sociais e políticos do mundo onde vivo, mas entendo que faço parte deles, e não a toa não nasci com habilidades para a política ou para escrever e analisar a problemática da migração desenfreada.
Mas como parte do problema, cabe a mim encontrar um jeito de contribuir da maneira que posso, no lugar onde me cabe no momento atual. Mesmo que isso signifique apenas comprar um pacote de fubá para a mulher pedindo na frente do supermercado, mesmo que isso signifique compartilhar com você o que eu sinto.
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